Porto Alegre registra 4ª morte de pessoa em situação de rua em 12 dias
Na noite desta segunda-feira (9), mais uma pessoa em situação de rua foi encontrada morta em Porto Alegre. A vítima, uma mulher identificada como Franciele, é a quarta a falecer nas ruas da Capital em um intervalo de apenas 12 dias. A sequência de mortes, que ocorre em meio à intensificação do frio, motivou uma reunião da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (CEDECONDH) na Câmara de Vereadores para debater o tema nesta terça-feira (10). Com a presença de parlamentares, organizações sociais e de representantes do poder público, o encontro discutiu a efetividade das políticas de proteção da população em situação de rua na Capital. O vereador Pedro Ruas (PSOL), vice-presidente da CEDECONDH e proponente da reunião, iniciou o debate relembrando os casos e destacando a possível relação das causas de morte com as condições climáticas do estado.Os primeiros dois casos aconteceram no dia 29 de maio. Após uma madrugada de frio intenso, as duas vítimas, identificadas como André e Antônio, estavam na rua Voluntários da Pátria e foram encontrados sem vida com sinais de hipotermia. Em 5 de junho houve o registro do terceiro caso. O corpo de Manuel foi encontrado na Avenida Farrapos, sem sinais de violência externa. Segundo o delegado Daniel Ordahi, responsável pela investigação do caso, ainda não há o laudo sobre a causa da morte. O quarto caso foi registrado na noite desta segunda-feira (9). Franciele foi encontrada morta e o seu corpo foi encaminhado para o Serviço de Verificação de Óbitos (SVO). A causa da morte foi determinada como indefinida. Segundo a Pastoral do Povo da Rua, o corpo de Franciele foi localizado na Avenida Voluntários da Pátria, em frente ao Centro Social Irmão Antônio Bertolini.Na reunião desta terça estiveram presentes também os vereadores Erick Dênil (PCdoB), presidente da Comissão, Vera Armando (PP), Marcelo Bernardi (PSDB) e Alexandre Bobadra (PL). Compuseram a mesa ainda representantes de entidades, como Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), Elton Bozzetto, coordenador da Pastoral do Povo de Rua, Rodrigo de Medeiros, ouvidor da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS), Leonardo Barrios, Promotor de Justiça Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), André Coronel, Secretário-Geral da Prefeitura, Jaqueline Rocha, secretária adjunta da Saúde de Porto Alegre, Matheus Xavier, secretário de Assistência Social de Porto Alegre, entre outros. Jair Kriscke, em seu pronunciamento, apontou a responsabilidade do governo municipal sob as quatro mortes, definindo como uma “omissão criminosa do poder público municipal”. “Estamos vivendo em Porto Alegre uma situação gravíssima onde os direitos humanos, esse básico, de sobreviver está sendo violado, está sendo desatendido, quando o município tem recursos, tem equipamentos e tem toda a possibilidade de fazer aquilo que falta”, disse.A necessidade de atenção à implementação de políticas públicas municipais de atenção à população em situação de rua pautou a discussão. O coordenador da Pastoral do Povo da Rua Arquidiocese de Porto Alegre, Elton Bozzetto, destacou que as quatro pessoas que faleceram são do mesmo território da Capital, apontando que os equipamentos dos serviços municipais dessa localidade foram suprimidos pela Prefeitura.Rodrigo de Medeiros, ouvidor da DPE/RS, apontou a “falência da política pública municipal com a população de rua”, citando o caso da Pousada Garoa, onde 11 pessoas em situação de vulnerabilidade social morreram em um incêndio. No mesmo momento, o vereador Pedro Ruas (PSOL) destacou que foi a Defensoria Pública que acionou o município para exigir explicações sobre a duas primeiras mortes registradas por hipotermia em Porto Alegre. Entre os representantes do governo municipal, a secretária adjunta da Saúde, Jaqueline Rocha, apresentou informações sobre as quatro mortes registradas. Segundo ela, dois casos, os de André e Manuel, aguardam o laudo da causa da morte pelo Departamento Médico-Legal. Já nos casos de Antônio e Franciele, os corpos foram encaminhados para o Serviço de Verificação de Óbitos, e não houve a realização da necropsia. Nesses dois casos, a causa da morte foi determinada como indefinida, mas há o registro de que eles possuíam comorbidades.O secretário de Assistência Social da Capital, Matheus Xavier, destacou ações desenvolvidas pelos serviços municipais e apresentou os registros das pessoas falecidas com os serviços. Conforme ele, as quatro já haviam tido contato com os sistemas de atendimento em algum momento. O secretário também afirmou que, com o início da Operação Inverno em 29 de maio, as equipes abordaram 41 pessoas em situação de rua e apenas uma aceitou ser atendida. Esse ponto foi rebatido pelos representantes de organizações sociais que questionaram a razão pela recusa aos serviços. “Isso mostra que tem alguma coisa errada. O que está sendo feito e o que precisa ser mudado nessa abordagem? Eu não posso admitir que uma equipe saia e faça 41 abordagens em um dia frio, em um dia de risco, e só um aceite e não tenha que se descobrir o motivo e como solucionar”, pontuou Nelson Khalil, presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência do RS (COEPEDE).“Quando se fala aqui que as pessoas não querem ir pro abrigo, parece que é uma ação voluntária das pessoas em não quererem ir. A gente tem que ter a dimensão que essas pessoas passam por um drama, que é psicossocial, que é um drama em que elas estão renegadas à própria sorte, à marginalidade. Não é porque elas querem, é porque a gente vive em uma sociedade muito desigual”, apontou Fabiano Zalazar, representante do Sindicato dos Servidores da Justiça do Estado do RS (Sindjus). Fonte: Sul 21 / Imagem: Guilherme Santos/Sul21