Notícia SINASEFE IFSul

29 de julho 2025

Um ano após Lei do Marco Temporal, relatório aponta aumento da violência contra indígenas

Um ano após Lei do Marco Temporal, relatório aponta aumento da violência contra indígenas O primeiro ano de vigência da Lei do Marco Temporal foi marcado por conflitos e aumento da violência contra os povos indígenas, segundo aponta o relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil de 2024, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Em todo o Brasil, foram registados 211 assassinatos de indígenas, sendo sete deles no Rio Grande do Sul. Lançado nesta segunda-feira (28), os dados do documento reforçam a necessidade da demarcação das terras.O relatório funciona como um instrumento de denúncia sobre as violações de direitos dos povos originários. O estudo reúne 19 categorias de análise, distribuídas em três eixos: violência contra o patrimônio indígena, violência contra a pessoa e violência por omissão do poder público.O ano de 2024 foi o primeiro sob vigência da Lei 14.701/2023, conhecida como Lei do Marco Temporal, aprovada pelo Congresso Nacional no final de 2023. Segundo o Cimi, a norma fragilizou os direitos territoriais dos povos originários, gerando insegurança jurídica e incentivando conflitos e ataques em todas as regiões do país.Conforme o relatório do ano de 2024, com a nova lei em vigor, as demarcações avançaram lentamente, enquanto terras indígenas, inclusive as já regularizadas, foram alvo de invasões e pressões de grileiros, fazendeiros, caçadores, madeireiros e garimpeiros. Os números de assassinatos e suicídios entre indígenas permaneceram elevados, assim como os casos de desassistência e omissão por parte do Estado.“A minha tristeza maior é a violência, porque é uma coisa que eu não entendo. Nós temos uma bandeira que lá tem ‘Ordem e Progresso’, temos uma Constituição Federal que era favorável a gente, e aí vem essa lei 14.701. Uma lei que vem para deslegitimar, criminalizar e também trazer a invasão dos grileiros, dos fazendeiros às nossas terras. Porque essas terras estão só no processo de demarcar, e isso não acontece”, disse Mari Tubinambá, liderança da Terra Indígena Tubinambá de Olivença, na Bahia, no evento de lançamento do relatório, realizado em Brasília.“Esse relatório é uma oportunidade de visibilizarmos o lento extermínio dos povos indígenas. O extermínio, eu digo, não tanto em termos de número de pessoas, mas de culturas, de línguas, das presenças dos primeiros habitantes”, afirmou o cardeal Leonardo Ulrich Steiner, presidente do Cimi, durante a apresentação do documento.O relatório também destaca os impactos da crise climática sobre os povos indígenas. De acordo com o Cimi, essas populações estão entre as mais afetadas por eventos extremos, como as enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul no ano passado. Conforme a análise do Conselho, nessas regiões, as inundações agravaram a vulnerabilidade de comunidades já fragilizadas.
Dados de 2024O relatório é elaborado anualmente com base em dados de diversas fontes, como os regionais do Cimi, comunidades indígenas, veículos de comunicação e informações públicas de órgãos como a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e secretarias estaduais de saúde.Em 2024, o capítulo sobre violência contra o patrimônio indígena registrou 1.241 casos. A seção está dividida em três categorias: omissão e morosidade na regularização de terras (857 casos), conflitos relativos a direitos territoriais (154 casos) e invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio (230 casos).Dentre as TIs com conflitos territoriais, dois terços (78) não estavam regularizadas, concentrando 101 dos 154 registros. No caso das invasões e danos ao patrimônio, 61% ocorreram em terras já reconhecidas, sendo 85 regularizadas, 10 reservadas e duas dominiais. Ao menos 48 TIs registraram incêndios ou queimadas, com extensas áreas devastadas pelo fogo.Em relação a violência contra a pessoa, a apuração contabilizou 424 casos em 2024, divididos nas seguintes categorias: abuso de poder (19), ameaça de morte (20), ameaças diversas (35), assassinatos (211), homicídio culposo (20), lesões corporais (29), racismo e discriminação étnico-cultural (39), tentativa de assassinato (31) e violência sexual (20).Os estados com maior número de assassinatos seguem os mesmos dos últimos anos: Roraima (57), Amazonas (45) e Mato Grosso do Sul (33). No Rio Grande do Sul foram sete casos.O terceiro eixo, violência por omissão do poder público, é divido em sete categorias. Segundo os dados, foram registrados 208 suicídios de indígenas em 2024. Os maiores números ocorreram no Amazonas (75), Mato Grosso do Sul (42) e Roraima (26). A maioria dos suicídios ocorreu entre jovens de até 19 anos (32%) e entre 20 e 29 anos (37%).Ainda segundo o relatório, 922 crianças indígenas de 0 a 4 anos morreram em 2024. Os estados com mais óbitos foram Amazonas (274), Roraima (139) e Mato Grosso (127). As principais causas das mortes, consideradas evitáveis, foram gripe e pneumonia (103 casos), diarreia e doenças intestinais (64) e desnutrição (43). O documento destaca que ações adequadas de saúde pública poderiam evitar ou reduzir esses números.Outros dados incluem: desassistência geral (47 casos), desassistência na área da educação (87), na saúde (83), disseminação de álcool e outras drogas (10) e mortes por desassistência à saúde (84), totalizando 311 casos.Conforme o Cimi, essas situações são recorrentes e referem-se à falta de infraestrutura em aldeias do país inteiro. Segundo a análise do documento, as inundações e acúmulo de chuvas no Rio Grande do Sul agravaram estas circunstancias e provocaram, em alguns casos, vulnerabilidade severa a comunidades inteiras.Por fim, o relatório aponta as ameaças aos povos indígenas em isolamento voluntário. Foram registrados 119 casos na Amazônia Legal, conforme a Equipe de Apoio aos Povos Livres (Eapil) do Cimi. Desses, 37 estão em áreas sem informações da Funai quanto à proteção ou demarcação. Ao menos 22 Terras Indígenas de povos isolados com algum grau de reconhecimento estatal sofreram invasões, exploração ilegal de recursos naturais e danos ao patrimônio.
Fonte: Sul 21 / Imagem: Gabriel Divulgação/Schlickmann/Cimi